Voltamos ao caso dos “vistos gold” para assinalar algumas curiosidades da cobertura mediática sobre o assunto e sobre um outro aspecto, intimamente ligado com a corrupção em Portugal, mas tabu nos meios de comunicação social.
O primeiro aspecto, já aqui abordado, prende-se com a persistência na difusão da tese (ou “ideia implantada”): "os vistos gold fomentam a corrupção".
Não acham curioso que, entre tantos outros casos de corrupção, exista uma certa desculpabilização dos corruptores envolvidos neste caso e se veja, frequentemente, na comunicação social atirar “culpas” para o sistema de atribuição de vistos?
Atente-se neste extrato de noticia do DN:
“Fosse para agilizar a emissão de um visto gold ou para a renovação de um passaporte, durante quase um ano a PJ recolheu todo o tipo de pedidos feitos a Manuel Palos, o ex-diretor do SEF e arguido na Operação Labirinto.
As solicitações, ao que o DN apurou, tinham várias origens: há desde políticos a magistrados e outros altos quadros do Estado. A todos, segundo fonte judicial, Palos respondia "à portuguesa", isto é, agilizava. Durante o interrogatório, foi confrontado com um desses pedidos. Tratava-se de apressar vistos para dois investigadores da Fundação Champalimaud.”
"Coitado" do ex-diretor nacional, lendo esta peça jornalística, ele apenas tentava “agilizar os processos”...
Como aqui no blog já referimos, em vez de espaço de reflexão e informação, a agenda mediática é o palco privilegiado da “guerrilha ideológica”. Neste caso em particular, como parece que os principais responsáveis já vêm do tempo do governo socialista (por ex., este “Sr. que agiliza processos” está à frente do SEF desde 2005, tendo sido nomeado para o cargo por António Costa) a cobertura mediática parece mais interessada - por ser esta a forma mais eficaz de atacar a imagem de psd e cds ("da direita"), junto da opinião pública - em centrar o ataque nos responsáveis políticos que criaram a figura dos vistos gold em vez dos corruptores. Indivíduos que ("para agilizar", note-se) “cobravam 10% por cada visto”!
Enfim, no mínimo é curioso como em alguns casos se “agilizam processos” enquanto noutros se pratica “tráfico de influências”…
Alguém, entre jornalistas e comentadores, estará genuinamente interessado em identificar as causas estruturais que estão na origem da corrupção em Portugal e que carecem de mudança?
Olhemos às entidades apanhadas na malha das investigações…
O Instituto de Registos e Notariado (IRN), tem a sua sede em Lisboa;
O Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, tem a sua sede em Lisboa;
O Ministério da Administração Interna, , tem a sua sede em Lisboa;
A Secretária-geral do Ministério da Justiça, tem a sua sede em Lisboa;
O SIS tem a sua sede em Lisboa…
Logicamente, os inevitáveis “escritórios de assessoria & afins” da economia pseudo-privada da capital, dirigidos pelos filhos e familiares dos “altos quadros” da administração pública, também se vão instalar em... Lisboa.
Até a C.M de Lisboa figura entre as instituições com ligação ao caso!
Hipótese de uma causa estrutural , efetivamente, facilitadora de corrupção:
Hipótese de uma causa estrutural , efetivamente, facilitadora de corrupção:
Se não vivêssemos num país tão (vergonhosamente) centralizado. Se todos os responsáveis pelos organismos acima referidos não frequentassem o mesmo meio social, os mesmos restaurantes, etc.. Se, essas mesmas entidades – nomeadamente, as públicas – estivessem geograficamente distribuídas pelo país, tal dispersão e maior distância entre os diferentes intervenientes, não resultaria numa redução da óbvia promiscuidade e uma significativa atenuação da propensão para fenómenos de corrupção?
Pensemos ainda nos casos do BPN, BPP e BES, e a óbvia deficiência de regulação do Banco de Portugal, cujas sedes se encontram todas em… Lisboa!
Se, entre jornalistas e comentadores – fundamentais para a manutenção do estatuto do establishment da capital -, alguém estivesse genuinamente interessado em identificar as causas - nomeadamente, na estrutura administrativa do Estado - que originam a corrupção, já há muito se teria concluído:
O Centralismo, ancorado no poder legislativo e na burocracia, é um facilitador da Corrupção!
Recordar este post “Reforma do Estado. Quem ganha e quem perde?”
“A burocracia e a teia jurídico-legal, são a explicação e o alicerce de muitas destas estruturas pois, para além de meros formalismos legais, muitas não prestam nenhum serviço ou mais valia ao cidadão.”
Sob o argumento de um “maior controlo”, é criada nova legislação num qualquer sector. Essa legislação é o pretexto para a criação de mais um instituto público, uma empresa pública, agência, etc., nascem assim mais uns empregos qualificados e bem pagos... Claro, sempre criados em Lisboa, mas pagos com os impostos dos portugueses do resto do país!
Na prática, criou-se mais burocracia e mais um nível de decisão. Simultaneamente, surge um novo patamar de decisão suscetível de actos de corrupção …
Mas, pelas razões aqui regularmente abordadas, este tema é um dos maiores tabus da sociedade portuguesa.
P.S.: Daqui a aproximadamente 1 ano, talvez tenhamos a oportunidade de ver os comentadores e fazedores de opinião do costume, pronunciarem-se sobre a "reforma" impulsionada pelo governo de A. Costa neste domínio: a criação da nova "Agência para os assuntos da Imigração e Cidadania" - presidida por uma "personalidade de renome" - e um novo requisito legal de atribuição dos "Silver Visa" que, sem dúvida, serão um "passo em frente" no sentido de devolver transparência ao processo de atribuição de vistos!